sexta-feira, 16 de abril de 2010

5x Favela em Cannes


O 5 x favela, Agora por nós mesmos está na Seleção Oficial do Festival de Cannes. O filme, concebido e realizado por jovens moradores de favelas da cidade do Rio de Janeiro, será exibido em uma das sessões especiais do festival que acontecerá de 12 a 23 de maio.
O 5 x favela, Agora por nós mesmos nasceu quando Carlos Diegues e Renata de Almeida Magalhães resolveram montar um projeto cujo objetivo principal era o de proporcionar aos jovens talentos das comunidades as mesmas condições de produção de qualquer filme de médio porte brasileiro. Para tanto, foram organizadas oficinas de roteiro e oficinas técnicas de realização cinematográfica em diferentes favelas do Rio de Janeiro, um processo que selecionou mais de 80 pessoas para participarem da preparação, produção e finalização do longa.
O resultado é um longa-metragem formado por cinco histórias independentes entre si, cômicas e trágicas, que refletem as múltiplas faces do cotidiano dos moradores das favelas e fogem dos estereótipos violentos que costumam se perpetuar na representação da vida nas comunidades.

>> Publicado no jornal O Globo
Ser excluído da disputa pela Palma de Ouro será menos doloroso para o Brasil neste ano em que o alagoano Carlos Diegues, escalado para integrar o júri de curtas-metragens e filmes universitários do 63º Festival de Cannes, levará “5x Favela, Agora por Nós Mesmos” para a mais importante mostra de cinema do mundo.
- Esses meninos merecem esta chance em Cannes, e vamos levar todos para a Croisette – diz Diegues – Todos os filmes feitos na Retomada sobre a periferia, incluindo o meu “Orfeu”, eram obras de cineastas classe-média que olhavam a favela de fora. Agora temos um ponto de vista diferente. Um ponto de vista de dentro, sem auto-piedade ou auto-complacência. Com esperança.

Notícia das Favelas

Carlos Diegues

O noticiário da imprensa, do rádio e da televisão, obrigado a cobrir os acontecimentos mais espetaculares, dá destaque constante à violência nas favelas do Rio de Janeiro, provocada por minorias armadas, sejam elas de traficantes ou milicianos. Não adianta repetir que essas minorias são numericamente insignificantes se comparadas à população de trabalhadores naquelas comunidades. O estereótipo aparece revigorado no material de ficção que vemos em filmes e séries, nacionais ou estrangeiros.

Nesses gigantescos guetos proletários, onde uma pequena classe média surgida nas duas últimas décadas começa a crescer e a se organizar, uma nova produção cultural está florescendo sem que o resto do mundo se dê muito conta, embora o país já esteja contagiado por ela na música, na linguagem e nos costumes. E essa é uma cultura que não é apenas do gueto, mas também de nosso tempo.

Os jovens das favelas cariocas formam uma nova geração que rompeu com os estereótipos de que é vítima e também com o conformismo que sempre relegou os moradores dessas comunidades a uma sombra de cidadãos de segunda classe, fantasmas sociais assombrando o sono dos ricos.

Desde 1993, quando tivemos o primeiro contato com organizações culturais nascidas nessas comunidades, temos acompanhado o progresso dos jovens cineastas moradores de favelas, produzindo curtas com mini-DVs, pequenas câmeras digitais domésticas, editados em programas acessíveis na grande rede. Esses filmes são vistos entre eles mesmos, circulando de um núcleo comunitário a outro, raramente vencendo a barreira do gueto.

Foi com o impulso de dar visibilidade a esses talentos que imaginamos o projeto Cinco vezes favela. Nele, esses jovens cineastas se tornam portavozes deles mesmos, testemunhando sobre suas próprias vidas e sentimentos, nos dizendo quem realmente são, construindo sua identidade muito além dos estereótipos que criamos para eles. E, ao mesmo tempo, contribuindo de maneira decisiva para a evolução do cinema brasileiro, num estágio tão rico e promissor.